Escrever é um ato de coragem, e
um pouco de loucura. Me refiro a atitude consciente de buscar nas palavras uma
forma de transcendência, política e expressão. Nas últimas décadas muitas das
coisas que fiz vinculam-se a escrita, mas pelo caráter ainda sisudo das
ciências, acabei por entre teses, dissertações e artigos acadêmicos vivendo, de
certa maneira, um hiato - grande, porque não dizer – entre outras formas de
narrar.
Entretanto foi na observação de
algumas mulheres poemas que povoam meu cotidiano e imaginário que pude outra
vez sentir o gosto, o desejo, de voltar a experimentar o texto, a partir de um
espaço íntimo, sagrado e criativo
Irmã Agostinha Vieira de Melo(do
bairro de Mandacarú), Ana Coutinho de Sales, Ana Adelaide Peixoto, Eliane Brum,
Mary Judy Ress, Cicilia Peruzzo e Vitória Lima. Mulheres com diversos
marcadores de diferenças entre si... e próximas por sua identidade, intimidade,
autonomia, consciência e liberdade na busca diária por dizer algumas palavras.
Fazendo de seus textos espaços de mediação, de vinculo social, memória,
sobrevivência, transgressão, arte, restauração.
De um modo muito particular as
linhas imaginárias e a tessitura dessas escritas femininas-feministas me
tocaram ao longo desse último ano que marcou a entrada na Idade da Loba, num
contexto no qual era necessário “cantar
sobre ossos secos”, assim como La Loba, de Clarice Pinkola Estés .
E retomar uma metáfora bíblica do texto de Ezequiel, em que num vale de
ossos secos se vê literalmente brotar à vida, e cuja descrição assustadora e
inteligente tanto poderia servir de inspiração ao George Lucas, quanto mostrar
que a escuta e a descoberta das palavras que
fazem sentido podem fazer renascer.
Essas mulheres sopram
encantadoramente sua esperança em contextos difíceis, em solos áridos num mundo
que parece às vezes desnorteado pelo excesso de verbos-imagens e ausência de
sujeitos-humanos. Algumas escrevem poemas secretamente e escutam horas sem fim
mistérios e sonhos de andarilhos que batem às suas portas ou que encontram nas
ruas, na vida; outras provocam mulheres mundo a fora para reescrever sua
própria história e falar desse tempo presente.
Às vezes elas moldam e refazem
suas dores e perdas soprando suas palavras-chave como verdadeiros cristais.
Elas acreditam e se deslocam de suas zonas de conforto, em direção “ao mais
humano, a mais amor por tudo”.
Sei que no encontro com o
silencio, a escuta, a leitura da narrativa dessas mulheres me descubro um pouco
mais e sinto suas escritas como dádivas, assim como celebro o encontro das
Águas (chuvas) e Terra, por tornar as estações fecundas.
Foto de Ícaro Azevedo, escultura do artista paraibano Chico Ferreira |
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