domingo, 28 de dezembro de 2008

Dois dias em Paris


Sempre gostei da Julie Delpy, protagonista de Antes do Amanhecer. Mesmo não a vendo constantemente nas películas, passei a apreciar os roteiros construídos por ela e seus parceiros, como o Ethan Hawke. O que me toca nos neles é esta capacidade de não ser panfletária e tratar idéias e sentimentos de modo inteligente.
Ser panfletário é uma chatice, e quase todos nós o somos, alguns mais outros menos. Alguns podem até achar que são austeros, ou que firmeza na afirmação de idéias próprias tem a ver com individuação, personalidade, autenticidade. Na verdade, ter sempre na ponta da língua um ponto de vista definido e por vezes até definitivo, sarcástico e pseudo instruído torna-se uma incidência no vazio, é a sensação que tenho quando me deparo com o absolutismo fluido dos pensamentos conservadores e das mentes pós-modernas (que em determinados momentos parecem gêmeos).
É um prazer instantâneo, dionisíaco e fecundo poder assistir Dois dias em Paris, porque nem sempre tudo está na ponta da língua, mas nas neuroses cotidianas dos afetos e da racionalização da vida. O filme trata não de romance, drama, comédia, aventura, mas de idéias que nos povoam, de subjetividades silenciosas, de “verdades” que nem sempre podem ser ditas, de rupturas com o que seja correto e incorreto.
Quando me percebo em roteiros como estes, tudo soa muito como espelho, antropológico reflexo de tudo que vi e “ainda não vi”. E me vem uma ânsia de restituição de mim, pensando onde foi que me perdi, e nos lugares em que posso melhor me encontrar...

Sandra Raquew dos Santos Azevêdo é doutoranda em Sociologia/UFPB.

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