domingo, 2 de novembro de 2014

Cemitério



Nunca tive medo deles. Na infância, minha mãe me levava sempre, pois cuidava do túmulo da família. Desde muito cedo era lugar comum. Um ritual mensal de visita, pois lá estavam minha avó, avô e uma tia, que como minha avó e minha mãe morreram antes de envelhecer, de chegar a tal melhor idade. 

Foi uma emoção inevitável ao ver Volver, do Almodóvar, sentir uma cumplicidade transcultural ao encontrar as mulheres cuidado de seus mortos( tão vivos, tão presentes). Também foi um momento singular a leitura da Solidão dos Moribundos, livro do Nobert Elias, pois veio cheio de reencontros com momentos da infância no Sertão, onde nós crianças colhíamos flores para vestir nossos mortos, parentes, amigos ou vizinhos. Então isso descortinou o medo de Morte. Mas hoje, depois de um filho, não de morrer…

Esse anos, depois de mais de uma década, reencontrei o Cemitério de minha infância ao me despedir de Ivontônio, amigo querido que partiu, coincidentemente no mesmo dia que minha mãe, e bem mais novo que ela. Entrei naquele lugar como numa casa antiga, conhecida e misteriosa… Para guardar o que ainda iria existir por um pouco de tempo, e constatar que que o Eterno que há nas pessoas transcende qualquer espaço físico e o ritual dos mortos…

Depois de guardar meu amigo fui sozinha aquele lugar da infância onde só encontrava a fotos dos avós e tia, e vi lá uma foto que havia feito de minha mãe. Acho que a melhor foto dela que já fiz pois conseguiu, milagrosamente, captar aquele olhar que para mim sempre sorriu.


Na memória de tudo que vivemos e do Todo nos encontramos, e nos deixamos partir em paz.